Ponte Lagoncinha
Entre essas vias militares, foi aberta uma com o traçado Brácara Augusta (Braga – Santarém, passando pelo Porto. Como é evidente esta teria necessariamente de atravessar o rio Ave. Segundo as mais lógicas e plausíveis conclusões a que chegaram alguns dos investigadores e historiadores portugueses, mais profundos e conhecedores da matéria, a travessia do rio Ave, servindo essa via militar a caminho de Santarém, era justamente feita através de um ponto por eles (Romanos) então construída na freguesia de Santa Marinha de Lousado. Esses investigadores historiadores chegaram a essa segura conclusão, baseados no aparecimento de elementos e de vestígios que constituíam provas verídicas e mais que convincentes dessa certeza.
Esses elementos e essas provas, a que nos vimos referindo, são os «marcos milenários», usados e colocados pelos Romanos ao longo das vias militares por eles construídas, encontrados nas freguesias de Santiago D`Antas, Cabeçudos e nesta terra. Por consequência parece não existirem dúvidas quanto à freguesia onde essa ponte romana foi construída (Lousado). A dúvida persiste, sim, quanto ao local exacto. Há historiadores que são de opinião ter sido ela construída no mesmo local onde se encontra hoje a Ponte da Lagoncinha; outros, porém, já são de parecer que ela poderia ter sido construída um pouco a jusante desta. Seja como for, o certo é que foi construída em Lousado, e isso é que importa. Dito isto, quase à laia de introdução, vamos ao assunto que aqui e agora me propus trazer: A Ponte da Lagoncinha. Começarei por dizer que é de estilo românico e que a sua idade será sensivelmente a mesma da nossa Pátria Portuguesa. Isto é : terá sido construída no século XI.
Há documentos que atestam ter D. Fernando Martins, bispo do Porto, falecido em 1185, deixado em testamento, vários legados para ajudar a custear a construção desta ponte. Nesse tempo era frequente haver pessoas que doavam parte dos seus bens, ou dos seus rendimentos, às pontes em construção ou a construir. Consideravam-nas obras de fundamental e primordial interesse social.
Donde teria vindo então à Ponte o nome de Lagoncinha?
Frei Leão de São Tomás, em 1651, citou um documento notarial, com a data de 1073, que se refere a uma doação de certos casais em Bougado e parte da igreja em Ribeirão, que D. Gontinha ou Goncinha, senhora ilustre, que viveu perto do rio Ave e da ponte, que dela parece ter tomado o nome embora com alguma corrupção do vocabulário, fez em favor de Gandemiro, Abade do Mosteiro de Santo Tirso. Dai se presume que o nome da Ponte veio dessa ilustre senhora. Alguns historiadores afirmam ter essa morrido no ano de 1120. alguns factos de grande relevo estão intrínsecamente ligados à história desta Ponte, merecendo por isso a sua narração.
Dentre eles, destacaremos aqueles que nos contam ter existido no Século XVII um Prelado insigne, que foi notável historiador e teólogo eminente, que se chamava D. Rodrigo da Cunha, sagrado Bispo de Portalegre em 8 de Novembro de 1615, vindo a ser Bispo de Braga, tomando posse deste honroso cargo em 10 de Junho de 1627. há documentos fidedignos que dizem ter D. Rodrigo da Cunha entrado no Arcebispado de Braga, pela Ponte da Lagoncinha, onde lhe foi feita carinhosa e muito entusiástica recepção.
Vejamos o que nos conta o cronista, ao referir-se a este acontecimento histórico: «Entrando no Arcebispado pela Ponte da Lagoncinha, tinham os lavradores na mesma Ponte um grandioso arco triunfal, alto e bem feito, tecido de ramos verdes de carvalho e castanheiro…..
Tinha João Baptista de Carvalho, homem nobre da cidade de Braga, no mesmo lugar, alegres danças camponesas e uma bem ordenada folia, com cantigas inventadas ao modo rústico da região para aquele efeito, com que grandemente alegraram a sua ilustríssima e as demais».
Outro histórico e notável acontecimento ligado a esta Ponte é o da sua travessia pelas tropas invasoras napoleónicas em Março de 1809. como é sabido, nesta invasão de tropas francesas entraram pela fronteira de Chaves, que se entregou quase sem resistência. Daí, o exército invasor seguiu caminho para Braga, onde chegou no dia 20 , depois de vencida forte oposição.
De Braga, o comandante militar mandou avançar para o Porto, ordenando que a marcha se fizessem em três colunas. A da esquerda recebeu ordens para seguir por Guimarães, a do centro teria que atravessar o rio Ave pela «Barca da Trofa» e a da direita atravessar o rio na «Ponte D`Ave». Por conseguinte, veio a ser a coluna do centro, pelas razões adiante indicadas, que atravessou a Ponte da Lagoncinha.
Vejamos o que nos contam as memórias do célebre marechal Soult, por ele mesmo escritas a este propósito: «Os reconhecimentos do general Lahoussax comunicaram que o inimigo estava entrincheirado na margem esquerda do rio Ave; as pontes estavam cortadas e muito canhões defendiam consideráveis entrincheiramentos na margem esquerda.
A minha coluna do centro foi por isso obrigada, impedida de passar na «Barca da Trofa», a subir ao longo do rio para forçar a Ponte de Lagoncinha que estava iriçada de barricadas e defendida por fortes entrincheiramentos. O 17º de Infantaria levou de vencida todos os obstáculos, atirando-se e apoderando-se da artilharia inimiga».
Mais episódios existem ligados à vida e história desta ponte, porém tornar-se-ia fastidioso contá-los, por isso ficamos por aqui. Esta ponte começou a perder grande importância na sua função social e serventuário, no começo do século XVIII, altura em que se começaram a fazer açudes no rio, tornando-o mais navegável. Daí a que nessa altura viesse a ser construída a já referida «Barca da Trofa», que serviu durante cerca de um século para o transporte e carga de toda a espécie, de uma para a outra margem do rio. Esta singular e rudimentar passadeira flutuante veio a dar lugar à construção da originalíssima e funcional «Ponte Pênsil» que foi bem um «ex-libris» e que se conservou em funções também à volta de um século, pois entrou em exercício em 1858 e foi retirada nos anos 30, dando lugar à ponte de cimento armado que, no seu lugar foi construída.
Pelas razões expostas, a Ponte da Lagoncinha, além de perder o seu «primado» de passagem obrigatória (por ser única), começou a entrar em desmazelo e, consequentemente, em estado de ruína. Consciente desta deplorável situação, a Junta de Freguesia de então fez, em princípios de 1940, uma circunstanciada exposição, dirigida à Junta Nacional de Educação, tendo esta por sua vez emitido parecer favorável, resultando daí, por decreto governamental nº 32 972, de 18 de Agosto de 1943, ser considerada, para todos os devidos efeitos, Monumento Nacional. Assim considerada, foi imediatamente tratada e reparada convenientemente, sendo-lhe restituída a sua primitiva traça. Foi um restauro grande e profundo, pois um dos arcos já havia caído, levando por isso largo tempo a sua reparação, sendo reposta em funcionamento e o seu trânsito restabelecido em 12 Setembro de 1954.
A este festivo acto assistiram vários membros do Governo e o filho mais dilecto desta nossa terra, D. Manuel Gonçalves Cerejeira, então Cardeal Patriarca de Lisboa. São estes, em linhas sucintas, os factos ligados à vida e história desta jóia arquitectónica que se chama «Ponte da Lagoncinha». É, sem favor de qualquer espécie, uma das pontes, deste estilo e dessa época, mais lindas existentes em Portugal. Esta opinião é de eruditos conhecedores destas coisas. Para finalizar, resta-me convidar aqueles que tiverem tido (se é que os houve) paciência para me lerem, a fazerem um passeio até aqui e ver «in-loco» a justeza das minhas palavras e das minhas apreciações.”
Fonte: António Máximo “Jornal da Trofa 10-07-81”
Obras de conservação e valorização
Segundo o autarca, “não se pode fechar uma ponte que é tão utilizada e necessária às populações, sem existir uma alternativa”, por isso“desejamos que tão rapidamente quanto possível o governo crie uma solução”.
De resto, a necessidade da ponte foi sublinhada pelo presidente da Junta de Freguesia de Lousado, Jorge Ferreira que explicou que “se esta travessia, os automobilistas teriam de recorrer à EN14 que representa um verdadeiro caos ou calcorrear área do concelho de Santo Tirso e Trofa, num total de cerca de 20 quilómetros”.
A travessia sobre o rio Ave é, de facto, um dos acessos mais utilizados por quem tem de circular entre Santo Tirso e Vila Nova de Famalicão, e por isso beneficiou recentemente de um conjunto de obras de conservação e valorização, no âmbito da Rota do Românico.
As obras implicaram um investimento de cerca de 154 mil euros contando com o cofinanciamento de cerca de 128 mil euros, pelo Programa Operacional Regional do Norte – Norte 2020, através do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER).
Para além da limpeza e tratamento das cantarias em granito, do restauro e nivelamento do tabuleiro da ponte, a intervenção implicou também a consolidação estrutural de fissuras existentes nos paramentos e intradorso do tabuleiro da ponte.
“A ponte ficou cinco estrelas e estamos muito contentes com o resultado da obra”, afirmou satisfeito Jorge Ferreira, que admitiu que gostaria de ver “o espaço envolvente melhor aproveitado”.
Também Paulo Cunha assumiu estar empenhado em melhorar as condições de fruição da zona envolvente à ponte.“Esta intervenção está condicionada pelo património e pelo rio, obrigando a obter autorizações junto das entidades que tutelam estes domínios. Temos um processo em curso, estando a ser elaborado um caderno de encargos e um projeto”, adiantou o autarca.
Sobre a despoluição do rio Ave, Paulo Cunha voltou a apontar o dedo à falta de fiscalização e a reclamar mais competências para o municípios nesta matéria. “Há décadas que se fala na despoluição do rio Ave e no investimento de milhões aqui realizado, porém é preciso prestar contas e perceber qual foi o efeito útil desse enorme investimento nacional e comunitário, porque não vale de nada investir-se na despoluição do rio e não se criarem condições para que ele continue a ser poluído”.